Estou trancada em casa, assim como todo mundo. Todo o mundo mesmo. Saímos apenas para fazer o necessário, comprar comida e comprar remédios. Isso pra quem tem uma casa pra voltar, e pra quem ainda tem dinheiro pra gastar.
Quem não gosta de música? É o que mais tenho sentido falta. Tem um lugar em Pinheiros chamado Bona, gosto muito de lá. Como toda casa de música, está fechada também. Quer ir lá comigo? Se você tiver tempo, é claro. Agora temos tempo, eles dizem. Eu acho que agora que temos tempo, nos falta espaço. Entende o que quero dizer?
Começo confidenciando que sou uma falsa extrovertida, Clarice tinha um termo melhor para definir isso, mas não me lembro agora, e nem sou Clarice, me perdoe.
Voltando ao Bona… Talvez seja melhor que você entre comigo. É noite, passando das 20h, entramos por uma porta de vidro onde somos recebidos por uma moça simpática e sorridente, de longos cabelos lisos e escuros. Como num passe de mágica, nos sentimos em casa. É assim que eu me sinto. Depois que entramos pela porta de vidro, as pupilas relaxam porque tudo é iluminado por uma luz quente e baixa, o ambiente é aconchegante, escolhemos uma mesinha que fica bem em frente ao pequeno palco, que de tão bonito é quase lúdico. Há uma estante com livros, plantinhas, objetos que mudam a cada visita.
Nas paredes olhamos os quadros antigos de grandes estrelas, tem Beatles na parede, e você sabe o quanto gosto de Beatles. Essa noite é minha, posso trazer para o palco quem eu quiser. Tomamos um drink, te entrego um sorriso cheio de esperança e você me sorri de volta. Um rapaz assume o microfone, nos agradece por estarmos ali, ele está pedindo para mantermos silêncio e para não dispararmos flashes em quem se apresenta, pois devemos respeitar os artistas. Ele é de uma elegância simples, muito natural. Tomamos mais um gole do drink, a casa está confortavelmente cheia. As luzes se apagam, o palco se ilumina e quem se apresenta é Pedro Pastoriz. Um rapaz alto de camisa polo, o cabelo cheio de personalidade briga com a camisa séria, quem vence? Ele segura um violão bonito, nos faz sorrir enquanto canta Restaurante Lótus, eu estou sorrindo mais porque me divirto com a ideia de uma meca dos vegetarianos. Pedro canta e conta histórias, às vezes tudo ao mesmo tempo. Ele se senta, se levanta, canta com voz suave, e não para de sorrir. O nome do álbum dele é Projeções, sabia? Isso explica muita coisa, ou não explica nada, o que é melhor ainda.
Quando o show termina, ele faz chover sobre a própria cabeça muitos confetes coloridos, e agora além de sorrisos a casa se enche de aplausos. Você me cutuca e me diz, olha pro lado. Eu olho e vejo, é ele, Tim Bernardes! Tim Bernardes também aplaude e sorri, os dois são tão altos e eu tão baixinha. Você tira uma foto pra mim? Pedro se despede com tanta educação que se nos contasse que é britânico eu acreditaria. Mas é brasileiro, que bom que é brasileiro.
Eu sei, você quer saber quando é que a gente volta. Deixa eu terminar meu drink… Voltamos logo, quase num piscar de olhos, prometo.