
Gosto de ler histórias sobre outras pessoas, principalmente sobre mulheres. Sinto que ao aprender sobre a vida delas, acabo aprendendo mais sobre mim.
Sem exceção, todas as histórias que li mostravam um desejo profundo pela liberdade, pela expressão, pela criatividade, pela autenticidade, e um amor profundo, todas tinham muito amor no coração. Camille Claudel, Yoko Ono, Marilyn Monroe, Clarice Lispector, Marília Gabriela, Etta James, Nina Simone, minha mãe… são tantas.
E ao mesmo tempo, todas essas mulheres viveram e vivem uma grande solidão.
O que acontece quando uma mulher salta as barreiras, quando ela desata os nós, por que a solidão fica tão evidente?
Quando eu tinha uns 5 anos, ganhei uma bicicleta. Era uma bicicleta Ceci da Caloi, era rosa e branca, e tinha uma cestinha. E como toda bicicleta de criança, ela veio com rodinhas. Minha rua era de paralelepípedo, então, toda vez que eu ia andar de bicicleta, sentia um desconforto com a bicicleta trepidando toda, aquelas rodinhas entortando, tornando minha experiência um tanto desagradável.
Mas as rodinhas me impediam de cair, foi o que minha mãe falou. Se você tirar as rodinhas você vai cair, você tem certeza? Eu tenho. Pode tirar.
Alguém tirou as rodinhas pra mim, pode ter sido meu pai, mas isso não importa.
O que importa é que aprendi na marra a encontrar o equilíbrio em cima daquela bicicleta, isso porque eu queria um caminho mais solto, mais livre, menos barulhento.
E eu caí. Aprendi que o paralelepípedo não é o melhor amigo dos joelhos e mãos de meninas. Tenho ainda algumas cicatrizes dessas quedas, bem pequenas, pequenas porque meu corpo também era pequeno. E eu cresci, eu ainda ando de bicicleta, eu vou por aí.
Talvez de alguma forma, a vida de uma mulher seja um pouco isso, aprender a andar de bicicleta, e em algum momento escolher, escolher quando é preciso ir mais longe, vai chegar o momento de tirar as rodinhas. E quando você for por aí, e a brisa soprar no seu rosto, não se sinta sozinha, você tem um mundo dentro de você.